Lisboa Boémia: Que segredos encerra a Lisboa dos anos 20?

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A Lisboa Boémia dos loucos anos 20, do foxtrot e do charleston, marcou uma geração e deixou marcas na essência da capital que me viu nascer. Por isso, não posso falar do livro “Os loucos anos 20. Diário da Lisboa Boémia”, de Paula Gomes Magalhães, sem escrever algumas palavras, em jeito de introdução.

O que dizer sobre este livro?! A partilha da opinião que faço sobre ele acontece com o coração aindaa aquecido por todos os factos históricos que li em “Os loucos anos 20”. Sou sou nascida e criada em Lisboa, apaixonada pela minha Lisbonita e, por isso, li este livro com a maior curiosidade do mundo, ansiosa por poder ver descritos no livro locais que conheço desde sempre ou de que já ouvi falar. Falar da Lisboa Boémia é falar, inevitavelmente, do Chiado e de tudo o que ele encerra, como as suas maravilhosas livrarias e recantos de promoção da cultura. O que nos promete este livro? Deixo-te aqui a sua sinopse:

O mundo respirava de alívio. Saída da grande guerra, ao ritmo de charlestons e foxtrots, a Europa vivia um período de otimismo, esperança, progresso e de alguma excentricidade. E Portugal não queria ficar de fora destes loucos anos 20. O país vivia uma profunda crise política, com os governos a sucederem-se a um ritmo de semanas ou até mesmo dias, e uma crise social e económica. Portugal estava à beira da bancarrota, com uma população analfabeta, a viver sem condições, sem trabalho e dinheiro para os bens essenciais. Acentuava-se o fosso entre os ricos e os pobres. Nas ruas de Lisboa, a sociedade mundana desfilava liberdade e elegância: cortes de cabelo à garçonne, os mais recentes modelos vindos de Paris, automóveis cada vez mais velozes. Assistia a corridas de cavalos no hipódromo, praticava desporto, lanchava nas mais conceituadas pastelarias, frequentava cafés e vivia devotada às últimas novidades do lazer e diversão, como o telefone ou a máquina fotográfica, sem esquecer os eletrodomésticos que agilizavam a vida de todos os dias. De noite, frequentava clubes e cabarets requintados, onde a música e a dança se misturavam com o jogo, o fumo e o álcool até ao romper da madrugada. A investigadora Paula Gomes Magalhães traça neste livro, amplamente ilustrado, o retrato vivo da mais louca e veloz década de que há memória.

Vamos agora à minha opinião sobre o livro?!

 

Lisboa Boémia: Terminar um livro com o coração quente com a história da minha cidade

Falar de uma cidade, principalmente se for capital de um país, é sempre um desafio interessante e que deve colocar à prova qualquer investigador ou escritor. Trate-se de um livro de ficção ou de não-ficção, falar de uma cidade que preenche o coração e alma de tantas pessoas deve ser um desafio enorme e deve ser de grande responsabilidade para quem escreve.

Paula Gomes Magalhães é uma clara apaixonada pela arte, pela cultura e pela história de Lisboa da época dos anos 20 e da Belle Époque, reflexo que se vê nos diversos livros e estudos que já publicou. O seu espírito crítico e artístico reflete-se na organização do livro, pincelado com inúmeras imagens, retratos e ilustrações que apenas torna a experiência de submergir na Lisboa dos anos 20 muito mais rica, mais intensa e que quase se nos entranha na pele e nos dá vontade de começar a dançar ao som do foxtrot e de todas as melodias desta fase do pós-Primeira Guerra Mundial. A ânsia de viver sentida por todos ao longo do continente europeu a recuperar de um conflito intenso sentia-se também entre os portugueses: “Quando da grande guerra, o poilu internacional, que vinha a Paris passar a permission, procurava com uma colossal ânsia de viver, nas poucas horas de descanso, aturdir-se numa atmosfera de luxo e prazer apagando assim as ideias negras que a vida arriscada de trincheira lhe faziam naturalmente sugerir” (pág. 9).

Para a Lisboa boémia dos anos 1920, as noites de espectáculo eram apenas o aperitivo, a nota introdutória de uma madrugada que se queria longa, animada e frenética” (pág. 197)

Apesar de toda a vida que circulava intensamente pelas ruas e vielas desta Lisboa boémia, a sombra dos anos vindouros começava já a fazer sentir-se. Primeiro, o golpe de Maio de 1926 a que se seguiu o início da caminhada de António de Oliveira Salazar em direcção ao poder, começavam a marcar um passo mais lento, menos louco e menos movido a danças sem fim nos diversos clubes que floresciam nos mais diversos recantos da capital.

Tal como acontecera noutros países da Europa, Portugal mergulhava na escuridão de um regime nacionalista, que se intensifica, já durante a década de 1930, quando António de Oliveira Salazar – homem forte das Finanças e arquitecto do equilíbrio orçamental- chega a chefe de Governo e faz aprovar uma nova Constituição, estabelecendo os princípios do Estado Novo” (pág. 14)

Esta é a capital dos marinheiros, das coristas, do jogo clandestino, do primeiro Código da Estrada criado em 1928, da emancipação crescente das mulheres e do aparecimento de um pó mágico nos corredores dos clubes que viria a dar origem à expressão da “maldita cocaína”, ao que parece introduzida em Lisboa por uma parisiense que ninguém deixava indiferente. E é todo este reboliço que se sente ao longo das páginas deste livro. A leitura torna-se bastante fluída, sem maçar e muito bem documentada pelo abrangente acervo fotográfico que surge ao longos de todo o livro. Todas estas fotografias, excertos de jornais e de revistas e ilustrações mostram bem como pulsava a vida desta Lisboa boémia que despertava para outros tipos de interesses e se tentava, cada vez mais, posicionar como centro cosmopolita afastado do Portugal rural, preso às tradições e que só se viria a acentuar nas décadas seguintes. Gostei muito da grande variedade de fontes citadas ao longo de todo o livro, demonstrando a grande profundidade da pesquisa realizada pela autora e permitindo-nos, se assim o desejarmos, saber mais ao consultar essas fontes que surgem enumeradas no final do livro.

Enquanto lia este livro, facilmente me consegui ver transportada para locais tão emblemáticos de Lisboa como o Chiado, a rua Garret e os seus locais obrigatórios de paragem como a Brasileira ou a loja Paris em Lisboa que ainda hoje marca posição destacada entre as demais, a Trindade, o Rossio, a Avenida da República que abria caminho para o Parque Mayer já ali ao lado. A descrição do aparecimento do teatro de revista, tão nosso, ajuda-nos a compreender a importância desta forma de expressão artística e o valor que tem para a nossa cultura e para a nossa essência de povo preso ao Fado mas sempre disposto a atirar uma farpa certeira a quem pisasse o risco.

Este é um livro especial, por toda a experiência que nos proporciona, pelas conversas que permite ter com outros familiares que conheçam Lisboa e que permitem ver que a nossa Lisbonita foi sempre um porto de abrigo e um centro activo de divertimento para quem por cá passava. Acho que a autora conseguiu uma bonita homenagem a uma Lisboa de outros tempos que, mesmo que não nos apercebamos disso à primeira vista, tem muito mais a ver com a Lisboa dos dias de hoje do que podemos pensar. A autora está de parabéns por toda a sua pesquisa e por nos mostrar uma Lisboa cheia de vida, uma “menina e moça” com vontade de se destacar e de ser a mais bonita de todas!

 

Outras sugestões de leitura

Se gostas de saber mais sobre a história de Lisboa e de Portugal, não podes deixar de ler o livro “A noite passada”, de Alice Brito. Este foi o livro do mês de Maio do Clube Leituras descomplicadas e transporta-nos até Lisboa e Setúbal do Estado Novo. Se gostas de romance histórico, este é o livro certo para ti!

 

O livro “Os loucos anos 20. Diário da Lisboa Boémia” foi-me gentilmente cedido pela Planeta de Livros.

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